Traduções Crédulas: Eleição em Romanos 9 – Análise de Romanos 9:6-13 – Duas Formas de Graça Preveniente

Eleição em Romanos 9

Análise de Romanos 9:6-13 – Duas Formas de Graça Preveniente

Então, o que encontramos é que a forma incondicionada da eleição referida por Paulo em Romanos 9:7-13 e encarnada na escolha divina de Isaque, Jacó e (por extensão) seus descendentes não foi uma eleição garantindo sua salvação final afinal, mas em vez disso uma eleição pela qual Deus garantiu-lhes uma oportunidade avantajada de exercer fé salvífica. Podemos dizer que a escolha dos descendentes físicos de Israel constituiu um compromisso por Deus de agressivamente buscar um relacionamento salvífico com eles dando-lhes acesso privilegiado à sua verdade. Note que esta caracterização da eleição por Deus do povo judeu paraleliza fortemente o conceito tradicional de graça preveniente (veja a seção “Definições” acima), que é esta forma de graça resistível estendida por Deus para uma pessoa pela qual tal pessoa pode ser trazida à fé e arrependimento, se a pessoa responder cooperativamente e deliberadamente à graça assim estendida. Sem tal graça preveniente, é impossível para a pessoa natural não-regenerada exercer autêntica decisão em fé em direção a Deus (Jo 6:44). Por meio da graça preveniente, ao descrente está ao mesmo tempo concedido acesso às verdades do Evangelho e habilitada a livremente responder em fé a estas verdades se assim desejar. A graça estendida à descendência física de Israel (linhagem tipo 2 acima) pode ser considerada uma forma da graça preveniente que constitui uma oportunidade que concedia ao povo judeu acesso e interação com as verdades salvíficas de Deus de tal forma que poderia potencialmente levá-los à sua salvação.

Uma vez que a forma de graça preveniente estendida a Isaque e Jacó foi discriminatória (no que Deus discriminou entre Isaque e Ismael, e entre Jacó e Esaú, como recipientes desta graça preveniente), Paulo fala em Romanos capítulo um e dois de outra forma mais básica de graça preveniente que claramente não é discriminatória afinal mas de fato universalmente dispensada. Em 1:19-20 Paulo diz que Deus tem deixado evidente para todos os homens Seus atributos invisíveis, Seu eterno poder e divina natureza mediante o mundo que ele fez. Em 1:21 Paulo diz que por meio desta revelação todas as pessoas conhecem Deus, em 1:25 ele diz que eles têm acesso à verdade de Deus, e em 1:32 ele diz que eles conhecem as ordenanças de Deus. Em 2:15 Paulo diz que mesmo os gentios têm a obra da Lei escrita em seus corações. Esta auto-revelação de Deus a toda humanidade mediante a natureza e a consciência humana é suficiente para deixar as pessoas sem desculpas para seus pecados (1:20; 2:1). Não apenas isto, mas a afirmação de Paulo sugere fortemente que a dispensação divina daquilo que podemos chamar de graça preveniente universal provê todas as pessoas com uma básica habilidade de exercer se elas assim escolherem.[8] Paulo diz “porquanto, tendo conhecido a Deus, contudo não o glorificaram como Deus, nem lhe deram graças, antes nas suas especulações se tornaram vãos, e o seu coração insensato se obscureceu.” (1:21) As atividades mencionadas aqui de honrar Deus e agradecer pressupõem o exercício da fé. A menção por Paulo destas atividades neste contexto implica que todas as pessoas são supridas com uma real capacidade de responder à auto-revelação de Deus destas formas (i.e. responder em fé), mas que elas falham em fazê-lo, escolhendo em vez disso suprimir a verdade em injustiça (verso 18). Como resultado, seu coração insensato é obscurecido (verso 21) e eles trazem para si mesmos a justa condenação e ira de Deus (verso 18a).

Esta interpretação de graça universal preveniente como habilitando uma uma verdadeira resposta em fé para todas as pessoas é adicionalmente confirmado pela escrita de Paulo em Romanos 2:4, em que ele aponta a hipocrisia daqueles que cometem os mesmos pecados dos quais julgam os outros. Paulo os reprova, “Ou desprezas tu as riquezas da sua benignidade, e paciência e longanimidade, ignorando que a benignidade de Deus te conduz ao arrependimento?”. A benignidade, paciência, longanimidade mencionadas aqui são todas expressões de sua graça preveniente universal, pela qual ele adia a total manifestação de sua ira sobre os pecadores a fim de dar-lhes adicional oportunidade para o arrependimento (cf. 2Pedro 3:9). De importância, Paulo diz que esta benignidade da parte de Deus tem intenção em levar tais pecadores ao arrependimento. Esta expressão “conduz ao arrependimento?” no verso 2:4b sugere tanto que tal arrependimento da parte de qualquer pessoa é genuinamente possível – não somente na teoria, mas na realidade, bem como mostram as expressões de fé mencionadas em 1:21 são verdadeiramente possíveis para qualquer pessoa – e que este arrependimento é feito possível somente diante da influência (o “levar”) da bondade de Deus, isto é, pela habilitação advinda da graça preveniente de Deus.

Note que não estou dizendo aqui que pessoas tenham capacidade natural de vir à fé e arrependimento sem divina assistência (o erro dos pelagianos). Em vez disso, de fato estou concluindo que dos capítulos um e dois de Romanos que Deus universalmente estende uma forma básica de graça preveniente (mediante a revelação da criação, e o atraso da ira de Deus para o pecado) pela qual todas as pessoas vêm a entender intuitivamente em alguma medida significativa a glória e perfeição morais de Deus e são dados tanto a oportunidade quanto a capacidade de responder livremente a esta revelação em fé e arrependimento, se assim escolherem. Pessoas não fazem assim, porém, mas preferem em vez disso livremente seguir as tendências de seus corações imprudentes, que mediante os efeitos do pecado de Adão foram tornados propensos a crer nas decepções do pecado (veja meu ensaio “Reflexões sobre Pecado Original”). Como resultado, todas as pessoas trazem a condenação de Deus sobre si mesmas, não porque Deus unilateralmente predeterminara que elas pecariam (um dos erros calvinistas) mas porque eles, devido ao exercício do livre arbítrio autêntico contra-causal (veja meus ensaios “As Vontades de Deus” e “Reflexões Filosóficas sobre o Livre Arbítrio”) suprimem o conhecimento de Deus via sua graça preveniente universal.

A existência da graça preveniente universal deste gênero como descrita por Paulo nos capítulos um e dois de Romanos explica como Deus pode ser justo em dispensar uma graça preveniente discriminatória do tipo descrita em Romanos 9:7-13 (que pelo bem da discussão eu chamarei de graça preveniete particular, como distinguindo da graça preveniente universal). Apesar de Isaque e Jacó serem de fato eleitos para uma posição de acesso privilegiado à verdade de Deus como membros da linhagem física da promessa, não é como se Ismael, Esaú e a outra multidão de gentios na terra foram abandonados a encarar a vida sem qualquer oferta de graça preveniente de Deus. No mínimo, eles todos foram recipientes da mesma graça preveniente universal descrita por Paulo em Romanos capítulos um e dois. Isto por si só é suficiente para torná-los, pelo exercício de seu próprio livre arbítrio, indesculpáveis, e esta dispensação divina da graça preveniente universal apenas é suficiente para provar a verdade da asserção que “Deus deseja que todos os homens sejam salvos e venham ao conhecimento da verdade” (1Tm 2:4; também Ex 18:23, Is 45:22, 2Pe 3:9)[9]. Deus expressou seu desejo seu de que todos sejam salvos não somente concedendo a cada pessoa uma intuição de Deus e de sua Lei justa, mas também concedendo a cada pessoa a capacidade de livremente responder a esta intuição com fé e arrependimento. O desejo de Deus neste assunto segue de sua própria natureza moral como um verdadeiro ser bom que deseja o que é bom para suas criaturas. Não há sentido, porém, que a natureza moral de Deus o obrigue a conceder a qualquer descrente mais que isto; de fato, Deus não está nem mesmo obrigado a estender esta graça preveniente universal para começar (i.e. isto é verdadeiramente graça), exceto enquanto ele estava restrito a fazer isto pela sua própria natureza moral que o causa a verdadeiramente desejar a salvação de todos os criados à sua imagem. Consequentemente, provendo adicional graça preveniente particular da espécie descrita por Paulo em Romanos 9:7-11, Deus está indo além, “andando uma milha a mais” por assim dizer, e pode dispensar esta graça desigualmente sem violações de quaisquer obrigações morais da parte de Deus, seja para si mesmo ou para suas criaturas.